2009/03/25

12 (dozzzzzzzzzze) horas ao dia na Escola

Não posso, não devo, nem como homem, nem como pai, nem como educador, fazer de conta que não soube (por estes dias) que a Confederação Nacional das Associações de Pais propõe que as nossas escolas venham a funcionar durante 12 (dozzzzzzzzze) horas ao dia, presumo que excluídos Sábados, Domingos e Feriados!... A ser sincero, preferiria não o ter escutado sequer, que a razão existencial primeira da dita proponente é, tenho fé que o seja, defender crianças e adolescentes enquanto crianças e adolescentes, enquanto filhos, enquanto educandos. Como defensor ferranho do direito à liberdade, nomeadamente, à liberdade de expressão e de opinião, por obrigado me tenho em ouvir o(s) outro(s), concordando ou não, contrapondo ou não, justamente também eu em pleno exercício delas. Mas (e ele haverá sempre um mas!) tal direito supremo obriga (nos) ao denominado comummente por "sentido de responsabilidade", no caso, que se argumente, que pesemos bem o quanto dizemos, o quanto escrevemos, de acordo? Caso não, tenho para mim que a indispensável honestidade de pensamento e de palavra se botará de imediato em causa, logo, também a referida liberdade de opinião, já que indissociáveis as duas, certo? (Me) questiono, pois: ora, se é constatado, se é sabido por nós (educadores, pais, pedagogos, psicólogos, médicos especialistas...) que de há muito que a Criança passa tempo a mais nas escolas, em jardins de infância, nas creches, em ATLs... em detrimento de todo aquele que deveria partilhar com os pais, com os irmãos e com os avós, em suas casas e nas dos avós, em ritmos, espaços e actividades pluridisciplinares diferenciadas, por que razão (repito-me), por que raça de razões necessárias ao seu crescimento, ao seu desenvolvimento global e harmonioso, é que há-de ela agora passar a "secar" (meio dia ao dia!) na Escola, porquê?!... Ah, pois, é que nós, pais, não podemos estar com eles (com os nossos filhos, os nossos educandos, as nossas crianças!); carecemos de tempo e de disponibilidade, percebe? Sim, claro, demitidos os pais, falho o seu papel insubstituível de pais, de educadores, a Escola que se vire, que se (re)organize, que se (re)formule, substituindo-os!... Não, meus senhores, o papel educativo da Escola é (salvo excepções devidamente sinalizadas) de complementaridade e não de substituição. Não vos demiteis, combinado? Ora venha daí comigo: a construção da "Escola de Massas" assentou, assenta em concepções burocráticas que perspectivam a justiça em termos de tratamento impessoal, opostas, pois, à evolução das ideias pedagógicas valorizando a "pessoalidade". É a chamada democratização do ensino em que, conforme Formosinho (1997), a evolução institucional da Escola se encaminhou no sentido de uma estrutura uniforme e estandardizada. Todavia, é igualmente sabido que a evolução das ideias pedagógicas caminhou em sentido contrário, implicando uma "pedagogia flexível" e uma "pedagogia diversificada" que se adaptem às diferenças de cada educando. Daqui ter antes sublinhado que a evolução institucional da Escola se tem oposto à implementação efectiva dos modelos pedagógicos, contradição que (ainda segundo Formosinho) é factor responsável pelo sentimento de mal estar e até de crise na Educação escolar. Vai daí que, contrariamente até ao redito "bom senso comum", saltam da cartola socrática Dona Lurdes mais seus "mais-que- tudo" e, claro está, seu estimado "bode expiatório": os docentes de Portugal!... Eureka!... Eis, finalmente, meus senhores, a chave do problema; eis, já agora, igualmente, a chave da solução: acabe-se com estes "professorzecos", debandem eles, punidos, penalizados, para a refo(r)mita, para um outro "carreiro", para a "bolsa" que se lhes aprouver ou tão só para poiso de "titulares" do arremedo, da chacota, ok? É, o que está decidido decidido está: bem sei que os perdi, bem o sei, mas a verdade é que o povo está comigo!... É, o que é preciso, o que é urgente é uma Escola a tempo inteiro, combinado?... (Calha não calha? A maioria dos pais até despega a essa hora...) Os "...zecos" que se cuidem, que se amanhem, que se...! Malandros, preguiçosos, é o que eles são, ou não sabieis?!... Seja ele trabalho individual, seja ele trabalho de escola, seja apenas e só "fardo estatístico-burocrático", não interessa; seja lá ele o que for, o que foi decidido, o que restará para a História é que José foi o pai e Maria a mãe. O(s) Menino(s) que se ergam das palhinhas com as estrelas, que bocejem em carrinhas pela matina, que virem costas aos campos e às serras, que abandonem vacas, burros e demais, que se ajuntem e se amontoem por entre paredes de betão, corredores armados até de cacifos, de tons, de sons e de gente da alvorada ao entardecer os mesmos (sempre os mesmos!) de Segunda a Sexta... todas as semanas... todos os meses... ano após ano... _ Verdade, vizinha, o meu Joãozinho até já fala Inglês, veja só!... E música, aquilo é qu'ele gosta de música!... Cá por mim, bem que o metia no karaté... na ginástica... na natação... mas (sabe como é, vizinha) os euritos não esticam!_ ... nem o teeeeeeeeeeeeempo!!! (exclamou-lhe) Por falar em "tempo": a resposta que a Escola e o Jardim de Infância e a Creche e o ATL... fornecem às pressões sociais advindas, precisamente, da colonização do tempo futuro, conduzirá, de facto, a uma Educação sucedida para a flexibilidade, a imaginação e a criatividade que o risco e a incerteza demandam? E já agora, meus senhores: como se comportará (num futuro breve) uma sociedade formada por adultos a quem (na infância!) lhes retiraram o tempo de infãncia, o direito ao tempo para brincar, aprisionando-a (12 horas ao dia!) na cadeia da busca do (reeeeeeeeeedito!) sucesso? 24 de Março de 2009 jão cerveira

1 comentário:

Anónimo disse...

Nem sequer é necessário ler, ver ou ouvir as bases que sustentam esta proposta para se determinar que na sua génese se encontra um conceito de sociedade totalitária. Isto é, ao Estado compete a responsabilidade da educação e o zelo pela segurança das crianças. E ainda a determinação do seu futuro. Isto é, o Estado ao querer assumir tal posição acaba por marcar e determinar logo nos primeiros anos de vida o futuro, o sucesso ou insucesso dessas mesmas crianças que, está bom de ver, pertencem às franjas das classes sociais mais desfavorecidas.

Ora estes princípios, que nada têm de original (assim era na Grécia Antiga), configuram, no nosso estádio de desenvolvimento civilizacional um modelo de sociedade nazi-fascista.

Seria de supôr que, com o desenvolvimento das novas tecnologias de produção em massa, de computadores mais potentes e da generalização da Internet, o Homem, enquanto indivíduo,pudesse ter mais tempo para si e para o seu núcleo social e familiar.

Paradoxalmente, somos confrontados com, por exemplo, o aumento da idade da reforma, ou do número de horas de trabalho por semana. Muitas família são ainda pressionadas a encontrar uma segunda ocupação, geralmente às escondidas da Lei, para conseguirem um rendimento familiar que lhes permita um vida condigna. O que é outro paradoxo já que a necessidade de segunda ocupação não é compatível com uma vida civilizada condigna.

Este afastamento do Homem do seu núcleo familiar e social acarreta consequências. E dessas consequências as principais vítimas são as crianças que, de muito cedo, se vêm privadas de condições de desenvolvimento pessoal adequadas.

Não é concebível a ideia de que podemos transformar as escolas num ghetto, para não dizer cadeia, onde, em especial a classe trabalhadora, deposita os filhos ao cuidado de um Estado que, não respeitando os Direitos dos Pais, não pode, pela mesma ordem de razões, respeitar os Alunos e os Professores.

Curiosamente muitos trabalhadores pensam, numa primeira abordagem, que esta medida é boa. "Posso fazer mais um biscate." ou "Tenho mais tempo para ir ao supermercado.", ou ainda "Se estão na Escola, estão bem.".

O trabalhador, desinformado, sem espírito critico, não consegue deduzir que o erro não está no facto de ter de ir à escola mais cedo buscar o filho, mas sim numa sociedade que é organizada de modo a manter as pessoas alienadas e ocupadas, SEM PENSAR, isto é, sem tempo para questionarem a sua própria existência. Desta forma, também se pode deduzir que os Direitos consagrados na Constituição e Carta Universal dos Direitos Humanos não são para todos. Com este modelo social, a criança ainda não nasceu e já tem determinado, salvo raras excepções, o seu futuro.

O enfoque no indivíduo, enquanto membro de um grupo, deve ser tido como prioridade. Bastará para defesa desta tese o facto de desta forma se promover a diversidade e não a homogeneidade.

O PS e o PSD, alheados das teorias políticas sobre as quais assentam os seus ideários, desprezam tudo o que possa incentivar a discussão critica. Para eles só há uma verdade, a deles. No caso vertente, nem sequer assenta em qualquer base científica pois não há (à excepção de algum psicopata nazi) pediatra, antropólogo, sociólogo ou pedagogo que defenda tal tese.

Portugal não está habituado a bem tratar a Ciência. Os dogmas religiosos que durante séculos contribuíram para a escravização do nosso Povo continuam arreigados nas profundezas da nossa alma colectiva. E urge a exorcização dessa forma de pensar, limitativa, errónea e injusta.

O problema não estã no mote do presente post, a escola a "12 horas", mas modelo social. A "escola 12 horas" é apenas um dos muitos reflexos negativos da sociedade capitalista e do neoliberalismo.