2009/02/10

... e para que o "amor" saia vencedor...

e para que o "amor" saia vencedor face ao "ódio", a respeito do que aqui escreve Célia Lopes sobre os mais jovens e a (não) leitura, parece-me oportuno ora deixar as ideias seguintes:

UM - ao lado da "literatura para adultos", a literatura infanto-juvenil (por alguns posta em dúvida quanto ao facto de poder ser considerada como verdadeiro objecto literário) participa também ela de um complexo processo comunicativo onde se interpenetram elementos diversos como o ideológico, o económico, o político, etc.
A ser rigoroso, deverei mesmo corrigir: aquilo de que falo é de Literatura para a Infância e para a Adolescência.
Como refere Marc Soriano (1975), a literatura para os mais jovens é uma comunicação histórica (localizada no tempo e no espaço) entre um locutor ou um escritor adulto, o emissor, e um destinatário criança ou adolescente, o receptor.
Outra coisa é, pois, literatura elaborada por crianças e por adolescentes, que também a há;

DOIS - dado o seu destinatário (criança ou adolescente), este tipo de literatura aponta para um entendimento da literatura enquanto fenómeno comunicativo específico, procurando abarcar os seus diversos pólos: a esfera do emissor e a do receptor, com as suas particularidades, suas especificidades, assim como a necessária contextualização, num momento e espaço precisos.
Deste modo, parace-me de crucial importância a necessidade de um conhecimento efectivo dos traços próprios à fase de desenvolvimento da criança e /ou do adolescente, o receptor. Estou a lembrar-me, por exemplo, de suas estruturas linguísticas, intelectuais e afectivas;

TRÊS - tal como consideramos a existência de uma literatura para a infância e para a adolescência (vulgo literatura infanto-juvenil), parece-me não menos importante que tenhamos em conta uma situação plural, isto é, várias "escritas", adequadas (ou não) a cada um dos estádios ou fases de desenvolvimento do indivíduo humano;

QUATRO - a escritora Henriette Biochonnier (1991), reflectindo exactamente sobre estas questões, chama a atenção para o seguinte: o termo genérico literatura para crianças recobre duas realidades contraditórias: o mundo da literatura e o das crianças.
Por literatura entende-se geralmente (diz ela) escrita livre inspirada, uma estratégia pessoal do autor, não tendo a preocupação de agradar a ninguém em particular. É o mundo da literatura.
Quando escrevemos para crianças (junta Henriette), a estratégia é forçosamente muito diferente, uma vez que nos dirigimos a um público-alvo preciso, relativamente (des)conhecido, cujo limite de idade costuma situar-se por volta dos 12 anos.
Assim, acrescentar "para crianças" à palavra literatura acaba, pois, por evocar um outro género literário, uma outra forma de escrita;

CINCO - escrito o que está nos quatro pontos anteriores, deixo aqui colocada a questão: como dar às crianças e aos adolescentes textos de boa qualidade, acessíveis ao seu nível de leitura, ligados ao seu ambiente cultural?...
É que, como salientam Christian Poslaniec (1992) e Denise Escarpit (1998), sou de opinião de que continua ora reinando um reduzido interesse das várias instituições de validação literária (crítica, universidade, etc.) em relação à literatura para crianças e para adolescentes!...

Jão Cerveira
08 de Fevereiro de 2009

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